Meditações, impressões da vida, memórias revisitadas, crônicas fotográficas, muito blá blá blá... É só para deixar registrado o que penso do mundo (antes que eu morra e não conte, ou mostre, nada a ninguém).
segunda-feira, 26 de março de 2012
Em cantos da Chapada
A proposta era rodar pela Chapada. A única decisão que tomamos antecipadamente é que dormiríamos duas noites em Lençóis e uma em Ibicoara. Mas o resto estava em aberto. De Cruz das Almas, eu, Aless e Moacyr (primeira vez dele nas trilhas, na Chapada, era um batizado!). Nós seguimos para pegar Marcos em Lençóis, onde ele se instalou nos dois últimos meses.
Marcos, amigo do CS, que veio da Espanha para o Brasil para uma experiência sociológica e antropológica, não tem dúvida que escolher a Chapada foi a melhor decisão que tomou. Marcos teve a oportunidade de conviver com pessoas que tem histórias ricas e belas, leu livros, visitou lugares e coletou dados sobre o período de formação das cidades, a busca pelos diamantes, a rotina dos garimpeiros, as histórias por trás da História, e fez questão de compartilhar conosco suas descobertas e seus amigos. Fomos a dois eventos com ele. O primeiro no Bar Cana, perto de onde ele estava hospedado e lá vimos um pequeno sarau.
Mas o cansaço era muito e fomos descansar para no dia seguinte conhecer a Trilha do Buracão.
Em Ibicoara ficamos hospedados na Casa da Roça, onde conhecemos a Bárbara e o Daniel, um casal mágico.
A pousada deles é um lugar encantador, com um projeto de vida interessante. Eles produzem quase tudo por ali mesmo, muitas árvores, plantas medicinais, muitas frutas, um café da manhã muito farto e delicioso, casinhas de roça para a gente ter a sensação que parou no tempo. Compramos tomates secos, gengibre e alho desidratado, frutas secas... e ganhamos jacas, que Marcos não tinha experimentado ainda.
A Casa da Roça fica a 4km da cidade e a 18 km da trilha da cachoeira do Buracão. Local perfeito para ver estrelas à noite, como fizemos, tomando vinho e procurando OVNI (eu, no caso).
A trilha do Buracão foi cheia de belas imagens e do meu desafio interno. Confesso que fiquei triste em alguns momentos, quando precisava realmente da segurança de outra pessoa porque meu joelho parecia que se dobraria para não mais me firmar. E eu refletia sobre a importância de tudo funcionar a contento, enquanto ia flagrando meus companheiros encantados com a paisagem e registrava o que me calava a alma.
Espero fazer um video com as imagens.
No dia seguinte fomos a Mucugê conhecer o cemitério com uma mistura de estilos, mas que lembrava uma arquitetura bizantina. Na verdade, o cemitério Santa Isabel é um cenário muito bonito diante da Serra. E dá a sensação que quem é enterrado ali fica numa harmonia com a natureza.
A paisagem da Chapada é sempre surpreendente. E indo para Igatu, foi frequente pararmos para fotos do que os olhos não querem esquecer.
As casas nas pedras, as rochas, tudo é muito cênico. E viramos protagonistas em poses, porque cenário espetacular pede pose. Acho que ficamos envolvidos pela aura da beleza natural e naturalmente nos tornamos bonitos. Almoçamos uma galinha caipira em Igatu e o mundo ficou ainda mais completo.
Seguimos para Andaraí, para ver o poço azul. Por 15 reais é possível se banhar no lago, com acompanhamento do guia, equipamento para mergulho e colete! Como fomos depois das 15h, horário não recomendado, não havia mais sol, mas dizem que pela manhã é coisa de cinema! Ainda assim eu descia as escadas e pensava no tanto de histórias que um lugar como aquele deveria guardar. E Juracy, nosso guia, não se fez de rogado, além de nos fotografar, ele nos brindou com relatos do que já foi achado ali e quais eram as teorias sobre o poço e as ossadas pré-históricas, de animais e humanos, encontrados por mergulhadores.
Quando voltamos, fomos a um último evento com Marcos, desta vez na casa da Claúdia, uma argentina de Córdoba, que está há dez anos em Lençóis e tem uma agência de turismo. Ela reuniu pessoas muito especiais em torno de uma mesa farta, com Godô de banana, palma picadinha, galinha caipira e arroz de garimpeiro, para provarmos. Tudo muito gostoso e feito com muito carinho. Sabe o sabor que fica de estar sendo mimado? Foi o que senti. Foi um jantar encantado.
Saco de Batatas
Depois que descobri a tal condromalácia, em 2011, eu não tinha me aventurado ainda em uma trilha à pé. Mas o fiz neste último final de semana. E foi um episódio cheio de sentimentos conflitantes. Ao mesmo tempo em que me sentia uma saco de batatas, também me sentia uma guerreira. Quem vê meus joelhos não imagina o quanto é chata essa degeneração da condromalácia.
Fiz a trilha da Cachoeira do Buracão, em Ibicoara, na Chapada Diamantina.
Quando eu tinha cartilagens completas e nenhuma dor nos joelhos, chamaria a trilha do Buracão de trilha leve.
Para quem já foi na Cachoeira da Fumaça em Pindobaçu (3 horas de caminhada subindo), já ficou horas perambulando com os espeleólogos nas cavernas Toca da Barriguda e da Boa Vista, em Campo Formoso (trechos que precisam ser de joelhos ou se arrastando), já fez rapel em Sobradinho (BA/PE) e na plataforma da árvore da RPPN Serra do Teimoso em Jussari (BA), que exigiam subidas íngremes, e já atravessou as encostas de Itacaré depois da última praia até a caverna do diabo, a trilha do buracão seria fichinha.
Mas depois de um diagnóstico de perda de cartilagens, edemas e dores muito chatas nos joelhos, com o inconveniente de não suportar o peso do próprio corpo, e reposição de um líquido que imita o sinuvial, a trilha pareceu o caminho de um pecador.
Se não fossem os anjos de minha guarda, aquele que tá no céu, que me deu forças, e os da terra (Jorge, nosso guia de Ibicoara), meus amigos Marcos e Moacyr e o carioca Vinicius, que achamos no caminho, para nossa sorte e que foi super solidário, eu não teria dado conta.
Essa foi uma vitória. Chegar ao final da trilha e tomar banho na Cachoeira. Mas senti também o gosto amargo de quem faz algo que gosta pela última vez.
Sei que não vai ser possível ficar me aventurando por aí, confiando na solidariedade alheia. E pior, depois sentindo o joelho me incomodando, avisando que exagerei.
Ah, saco de batatas, porque a galera teve que me levantar ou me aparar algumas vezes...
Com fotos minhas e de Moacyr Serafim.
terça-feira, 20 de março de 2012
Quando o inferno é aqui...
Queria saber desse descompasso entre o que somos e o como estamos. Sou equilíbrio, sei das provas e expiações terrenas, mas também sou desequilíbrio, porque se perfeita fosse, não estaria encarnada. Tenho descoberto em mim, personalidades diversas. E isso me coloca em situações de análise, de um ser em mutação constante.
Essa pessoa que fica por vezes deprimida, que acha a vida um saco, que se coloca na caverna por dias, é a mesma que passa períodos de euforia, que tem uma sede imensa por viver e que tem sentido intensamente o fato de estar na carne, viva, emotiva, sensitiva.
Essa pessoa birrenta, que se prende a detalhes, que não muda uma única coisa do lugar, é a mesma que ri de tudo, vive de bom humor, e leva a vida na esportiva.
Essa pessoa que crê na reencarnação, crê no espiritual, na essência do homem, é a mesma que acha que o mundo vai acabar, que o homem não merece o planeta e que os ETs existem.
Essa pessoa careta e moralista, que não se permite 'ficar', é a mesma liberal que fantasia dominações, que é autoritária na cama e acha interessante sexo tântrico.
É, eu sou o meu contraditório.
E não preciso de julgamentos, nem de fofocas a meu respeito. Não escondo o jogo.
Sou um livro, cheio de episódios engraçados, trechos sinistros, cheio de páginas de auto-ajuda, cheios de capítulos densos de boas energias, e rodapés sujos. Sou humana e meu inferno é aqui.
terça-feira, 6 de março de 2012
Meu processo de despedida
Foi um choque ver o corpo da vovó, dentro de um caixão, no meio daquela sala tão cheia de boas lembranças. Ver a casa cheia de gente triste. Velar, noite adentro. Orar e abraçar, abraçar e acolher o choro do outro, como a coisa mais natural a se fazer. Ver os netos carregando caixão... Tudo junto, um choque.
Eu já havia chorado em minha casa, assim que soube da partida. Então fiquei observando, conversando, e como parte do meu processo de despedida, fechando esse ciclo que iniciei quando comprei minha primeira câmera, enquadrando os acontecimentos ligados à minha avó. Tenho horas de gravação com ela. Em diversos formatos, desde 1991. Tenho fotos e mais fotos, da analógica à digital. E para mim era mais do que natural que eu me sentisse à vontade para registrar tudo. Acho que me acharam mórbida. Mas sei que ela compreenderia. Ela que se deixou fotografar na feira, comprando de um tudo, tratando galinha, fazendo doces, mexendo em panelas, costurando, bordando, dormindo, comendo. Ela que se deixou filmar entubada. Em UTI. Dopada. Tomando banho sozinha (e perguntando toda hora se eu estava fotografando suas partes). Ela que sempre soube ser a minha modelo preferida. Então fui olhando pelo visor e abstraindo. Eu já havia dito a ela um dia que não fotografava ou filmava minha avó, mas um ser humano que envelhece. E ela apenas riu naquela ocasião. Então tentei fazer o mesmo neste processo de despedida. Era a despedida de uma senhora querida, com 96 anos de belas histórias. Casa cheia, gente na rua, movimento de muitos que gostavam dela e também vieram se despedir.
Mas quando o caixão foi tampado, eu desabei por baixo dos meus óculos escuros. Ali não havia mais a documentarista. Era a neta quem via décadas de convivência com o amor de vó, indo embora. Acho que nem vi o que fotografei. Mas a câmera viu...
Ao longo da noite de ontem e do dia de hoje, fomos chegando, eu, JR, Celo, Rogério, Neto, Nícia. Os netos que sempre estavam juntos nas férias, estavam ali para se despedir dela. E eu fui meditando o quanto aquela senhora era agregadora. Ela ainda nos unia, porque nossa família foi esfacelada por questões de herança quando da partilha dos bens de meu avô, pelos irmãos. E nós, os netos, tínhamos pago um preço alto, no final da adolescência, início da vida adulta. Havíamos deixado de conviver. E todos nós estávamos conscientes de que agora não temos mais o almoço do dia de Natal, nem o dia 11 de março, quando sempre estávamos lá para festejar o aniversário dela. E sabemos que só depende do nosso esforço conjunto, para que o que restam dos laços, não se desmantelem. Porque não iremos mais à Vila do Conde, à casa da vovó. Então eram muitas despedidas. Do espaço físico. Dos objetos. Dos retratos. Das lembranças de boa parte da nossa infância. E depois do enterro, para o último almoço na mesa da copa, ficamos rindo das coisas que ela fazia, das broncas que dava na gente, do jeito de falar, de nos entupir de comida, merendinhas... E eu tive certeza que ela nos quer juntos. Tenho certeza que nos quer reunidos em mesas.
Eu já havia chorado em minha casa, assim que soube da partida. Então fiquei observando, conversando, e como parte do meu processo de despedida, fechando esse ciclo que iniciei quando comprei minha primeira câmera, enquadrando os acontecimentos ligados à minha avó. Tenho horas de gravação com ela. Em diversos formatos, desde 1991. Tenho fotos e mais fotos, da analógica à digital. E para mim era mais do que natural que eu me sentisse à vontade para registrar tudo. Acho que me acharam mórbida. Mas sei que ela compreenderia. Ela que se deixou fotografar na feira, comprando de um tudo, tratando galinha, fazendo doces, mexendo em panelas, costurando, bordando, dormindo, comendo. Ela que se deixou filmar entubada. Em UTI. Dopada. Tomando banho sozinha (e perguntando toda hora se eu estava fotografando suas partes). Ela que sempre soube ser a minha modelo preferida. Então fui olhando pelo visor e abstraindo. Eu já havia dito a ela um dia que não fotografava ou filmava minha avó, mas um ser humano que envelhece. E ela apenas riu naquela ocasião. Então tentei fazer o mesmo neste processo de despedida. Era a despedida de uma senhora querida, com 96 anos de belas histórias. Casa cheia, gente na rua, movimento de muitos que gostavam dela e também vieram se despedir.
Mas quando o caixão foi tampado, eu desabei por baixo dos meus óculos escuros. Ali não havia mais a documentarista. Era a neta quem via décadas de convivência com o amor de vó, indo embora. Acho que nem vi o que fotografei. Mas a câmera viu...
Ao longo da noite de ontem e do dia de hoje, fomos chegando, eu, JR, Celo, Rogério, Neto, Nícia. Os netos que sempre estavam juntos nas férias, estavam ali para se despedir dela. E eu fui meditando o quanto aquela senhora era agregadora. Ela ainda nos unia, porque nossa família foi esfacelada por questões de herança quando da partilha dos bens de meu avô, pelos irmãos. E nós, os netos, tínhamos pago um preço alto, no final da adolescência, início da vida adulta. Havíamos deixado de conviver. E todos nós estávamos conscientes de que agora não temos mais o almoço do dia de Natal, nem o dia 11 de março, quando sempre estávamos lá para festejar o aniversário dela. E sabemos que só depende do nosso esforço conjunto, para que o que restam dos laços, não se desmantelem. Porque não iremos mais à Vila do Conde, à casa da vovó. Então eram muitas despedidas. Do espaço físico. Dos objetos. Dos retratos. Das lembranças de boa parte da nossa infância. E depois do enterro, para o último almoço na mesa da copa, ficamos rindo das coisas que ela fazia, das broncas que dava na gente, do jeito de falar, de nos entupir de comida, merendinhas... E eu tive certeza que ela nos quer juntos. Tenho certeza que nos quer reunidos em mesas.
segunda-feira, 5 de março de 2012
Nira se foi
Nícia me ligou e disse: "vovó foi descansar"...
Eu imediatamente lembrei da última vez que a vi, no Hospital, na semana passada, deitadinha, com respiração difícil. Lembro que cheguei perto, pedi a benção e dei um beijinho no braço dela. "Oi, minha filha. Cadê o menino?" Perguntava por Arthur. Depois aos poucos ressonou. E eu fui embora do hospital sem que ela voltasse a acordar.
É a minha última lembrança.
Em diversas postagens falei da importância da minha avó em minha vida. Mulher forte, nos fez ver, a vida inteira, que precisamos seguir em frente.
No vídeo Tempo de Nira, um retrato da mãe de meu pai, que tanto admiro.
Durante quase três anos eu contei aqui como ela estava lidando com o tempo e com o fato de envelhecer, de perder algumas capacidades, e como isso me deixava em alerta, um dia perderia minha estimada Nira. Mas perder será mesmo a palavra certa?
O ano de 2011 foi tão difícil, dias em hospital, corpo cada vez mais debilitado, foi parar em UTI cardíaca. E quando achávamos que realmente Nira estava velha, parecia uma fenix no casamento de Janaína, sua primeira bisneta. Falei como ela parecia uma Rocha.
E sempre que conversávamos, ela dizia que a morte havia esquecido dela, que precisava seguir, dar lugar aos novos...
Da última vez que estive no Conde pude ver de perto sua espera...
Nira finalmente vai usar a roupa de morrer.
E eu estou fechando um capítulo tão importante da minha história. Eu e minha avó, minha avó e eu...
sábado, 3 de março de 2012
Encontros de prazer
Tivemos mais um encontro da confraria e precisava contar sobre a minha alegria.
A Confraria do Vinho e do Filme acontece sempre às quartas, em Cruz das Almas. Levamos bons vinhos e bons filmes para assistir e comentar, discutir ou debater, analisar ou apenas ver, apenas ver como exercício. Ver com os olhos do diretor, com os olhos do espectador ou com os olhos do simples apreciador, sem pressa, fugindo do tempo da pós modernidade, que já não aprecia o tempo fílmico. Na medida em que bebemos vinho e já mudamos a percepção, o filme com seus movimentos, seus enquadramentos, seus sons, seus diálogos, seus silêncios, acabam nos tocando mais. Então paramos o filme no meio, paramos para ver algo que deixamos de ver, comentamos, e é tudo muito lúdico, muito sem compromisso com o formal, com o acadêmico, e ao mesmo tempo temos o compromisso conosco, com nossa alegria de compartilhar.
Temos Navarro, que já viu todos os filmes e nos faz ficar atentos a tudo.
Temos Aless com seus dotes culinários, onde também contribuo quando posso, mas tenho levado mais vinho, pela comodidade, porque fico em Cachoeira o dia todo e chego em cima da sessão.
Temos Moacyr (que também já provou que é maravilhoso na cozinha e como anfitrião) e Aquilino, somando no vinho, e agora, depois de alguns convites, temos Soraia (também maravilhosa como anfitriã e com dotes culinários) e Luciano, agregando vinho e prazer.
A última reunião foi uma farra! Eu gostaria de ter uma confraria também em Salvador para os finais de semana, quem se habilita?
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