domingo, 10 de abril de 2022

O vazio da minha casa

 Lá se foi ele, aos 19 anos, viver longe de toda a família. Ele escolheu ir. Escolheu uma universidade do outro lado do Brasil. 

Eu me vejo no mesmo papel que viveu a minha mãe, desafiadoramente desapegando de filho, com um vazio na casa e na alma. 

Dói e ao mesmo tempo temos que sorrir e dizer: se você está feliz, eu estou feliz, meu filho. 

Mas cá dentro eu percebo agora o quanto a minha mãe teve que se fortalecer para não despencar no choro na minha frente. 

Naquela época em que fui, sem internet, sem fotografias diárias, sem mensagens gravadas de bom dia, sem pequenos vídeos das descobertas diárias da nova rotina, acho que minha mãe vivia num limbo de uma mãe que ignora e sofre duplamente. Eu sofro menos, é uma realidade. O virtual ajuda a diminuir a distância. E isso é algo que acalenta muito. 

No vazio da casa, as imagens que chegam preenchem meu coração. 

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Mãe de Universitário

 Mininin de mãe está a cursar uma faculdade! 

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

A maior montanha

Defendi a Tese em plena pandemia. No dia 12 de janeiro de 2021. 



Agora é oficial, finalizei os estudos formais: doctorem habemus. E na área que amo, que escolhi e no tema que me apaixonei.



A defesa em si exigiu-me apenas que recordasse do que estudei, do que aprendi, do que consegui pensar acerca do tema. Como entreguei a tese em julho e a defesa foi em janeiro, sim, precisei recordar um pouco. Após a minha apresentação de 20 minutos, tempo que parece tão pequeno para falar de um trabalho desenvolvido em quatro anos, foi a vez de ouvir as considerações dos membros da banca e responder as arguições. A minha banca foi generosa, foi fraterna, foi atenciosa. 

A banca para as provas de avaliação da minha tese foi composta por:

Prof. Dr. Moisés Adão Lemos Martins, da Universidade do Minho, o Presidente da Banca.
Prof.Drª Anabela Gradim, da Universidade de Beira Interior.
Prof. Drª Catarina Sofia Rodrigues, da Universidade dos Açores. 
Prof. Drª Felisbela Maria Carvalho Lopes, da UM.
Prof. Dr. Joaquim Manuel Martins Fidalgo, da UM.
E meu caro orientador, Prof. Dr. Luís António Martins Santos. 





Com a pandemia, a minha família longe, a presença afetiva física no momento da defesa foi apenas com o meu menino como companhia, mas foi a parceria perfeita. Ajudou-me nos detalhes, emprestou-me os phones de game, tão bons, confortáveis e prático com o microfone. Ficou atento ao tempo que eu tinha para a defesa, atencioso com água, café, etc.



Eu confesso que o meu sonho de defesa de tese sempre incluiu a beca preta maravilhosa que a UMinho exige no ritual presencial. Fui a pelo menos umas 15 defesas, entre as do Programa Doutoral de Ciências da Comunicação e do Programa de Educação, de amigas da UFRB que faziam o Dinter, o doutoramento conjunto entre UFRB e UMinho.  

Para efeitos de memória, vou deixar dados aqui para eu não esquecer e que também podem ajudar a quem vai vivenciar a mesma situação de defesa online de tese. Eu aluguei uma sala de escritório com garantia de internet a cabo e wifi, com duas linhas integradas de empresas diversas e gerador de energia, para não correr o risco de queda na transmissão entre Lauro de Freitas, Bahia, Brasil e Braga, em Portugal. A sala também tem a comodidade do ar condicionado, equipamento que não tenho na nova morada do oitavo andar. 
E tudo correu da melhor forma. Eu gostei muito da estrutura da RF Coworking e de sentir que, pelo menos nas questões logísticas, eu não teria problema. Água, café, tudo na mão e incluído no pacote. Também a sala com acústica maravilhosa, sem ouvir nada fora, foi perfeita. O custo do pacote de cinco horas de uso do escritório ficou em R$100,00, cerca de €15,00. Foi um bom custo benefício. 

A minha apresentação ocorreu dentro do tempo. Confesso que tive que correr nos últimos slides, normal. 
Depois foram muitas as perguntas. Nem sei se eu consegui responder a todas, pois eu tentava ouvir tudo e escrever as perguntas, mas a minha mente já estava a elaborar algumas respostas, e penso, acabei por esquecer algo. 
No registro da minha postura ao anotar as perguntas, feita pela Técnica da transmissão da UMinho, a Doutora Manuela André, que gentilmente enviou-me fotos da defesa:


Durante as avaliações, os seis professores presentearam-me com palavras tão bonitas nas suas considerações, de valorização do tema, dos resultados, da importância da pesquisa, de todo o rigor científico. Claro que apontaram detalhes de como alguns autores poderiam ter sido melhor explorados, também sugeriram que eu poderia ter estudado outras personagens além do Presidente de Portugal,  Marcelo Rebelo, ou ainda sugeriram uma ferramenta metodológica a mais na avaliação das imagens. Mas não discordaram de nada, foi sempre na sugestão do que poderia estar melhor, pois nada é perfeito e na ciência, é bom que nunca o seja. 

Ouvi-los foi um momento único! A nota máxima pareceu-me um troféu de copa do mundo. Eu, nas disciplinas que cursei na UM, nunca consegui tirar a nota máxima em nenhuma tarefa. Nem eu, nem nenhum dos meus colegas. Daí eu sabia que era algo para verdadeiramente acreditar que o trabalho estava bom e que a defesa foi bem feita. 

No dia seguinte a minha co-orientadora escreveu-me:

"Não imagina a alegria que me deu ontem o modo como correu a sua prova. A Alene esteve mesmo bem e o resultado foi bem merecido."


Nesta foto está a Professora Madalena com o seu sorriso lindo, a Valéria Castanho e a Cristiane Venâncio, as duas amigas que esse doutoramento me permitiu ter e que eu espero conservar para sempre.  

Eu já falei da ligação espiritual com a minha orientação, com a minha co-orientadora, mas volto a recordar aqui... 

Preciso também agradecer aos amigos que lá estiveram e por insistência deles, pois eu, nesse processo de bipolaridade emocional, não convidei as pessoas. Eu estava a me sentir absolutamente sem vontade de exposição.

Mas foi mesmo uma alegria vê-los na platéia, todos a demonstrarem muito carinho:


A Tereza, o Enrickson.



Meu amado irmão Marcelo, meu orientador de mestrado Professor Doutor Alexandre Schiavetti, que fez questão de aparecer assim que a sala foi aberta virtualmente e me fortalecer com o seu rosto tão querido. 
Mateus Luan, que dividiu casa comigo em Braga, tão meigo e educado. 



Meu filhote Arthur, que também ficou atento a cada etapa da defesa, inserido na sala, a ouvir tudo o que era dito pelos professores, além de estar ao meu lado. 

Marcus, meu amigo que, tenho certeza, vibrou em energias positivas pois é uma pessoa que medita e sempre em boa vibe. 

E Abílio, meu colega de turma que foi quem trabalhou com um tema com proximidade ao meu tema e, sem dúvida, foi a pessoa que mais me possibilitou acesso a livros, artigos, material fisico ou digital, na tarefa de revisão de literatura. Minha enorme gratidão ao Abílio. 

Também agradeço às pessoas que não conheço pessoalmente e que assistiram, pois o link estava exposto na página do ICS/UMinho. 

Até tive um bonito retorno da Marina Polo, que fez questão de encontrar-me pelo facebook, e  dizer-me que gostou do tema e do clima alegre e leve da defesa. 

Realmente, o fim da defesa foi uma comemoração virtual. Rimos, falamos abobrinhas, descontraímos. 

Entretanto, cumprida a tarefa e o objetivo alcançado, eu preciso falar da enorme montanha que eu me senti a subir neste doutorado. De todo o esforço que ele exigiu. Vou devagar. Segue o fio... 

Fazer um doutorado é como cozinhar o juízo, como colocar os miolos do cérebro para funcionar na carga máxima. É algo muito solitário, mesmo com ótimos orientadores, como foi o meu caso. 

Explico porque é cozinhar o juízo: é que num primeiro momento estamos empenhados em coletar dados, em ter conteúdo para analisar, em rever metodologias e assim vamos reunindo dados em forma de números, imagens, textos, entrevistas... 

Foi o que fiz durante quase três anos. Reuni autores, citações, fichamentos, imagens (1.590), foram nove entrevistas e decidi trabalhar com seis delas. E eu me senti afogando num mar de material. 

Foi tanto, tanto para analisar e fazer processos de indução, dedução e abdução, que eu parecia não ser capaz de dar conta. E eu, por ansiedade, fiquei paralisada no terceiro ano do doutorado. Eu começava algo e parecia que nunca teria fim. 

A ansiedade me levou a um estado deplorável. Eu acabei em processo que exigiu intervenção médica, psiquiatria, psicologia e todos me deram a mesma resposta: medo de não conseguir. Medo de errar. Medo de produzir algo confuso. Medo de não terminar o doutorado. E o ciclo de medo provocou uma bola de neve que saiu da mente, do emocional  e tomou o corpo. Somatizou.

Eu fiquei sem vontade de sair de casa, sem vontade de interagir com outras pessoas. Todas as vezes que alguém perguntava: como está a tese? como está o doutorado? eu confesso: eu queria xingar!

Terminei um relacionamento afetivo sem nenhum motivo (e peço desculpas públicas ao Hadi). Penso que ele não percebeu nada, pois era um namoro bonito, uma relação respeitosa, cheia de amizade, fazíamos tantas coisas legais nos finais de semana e eu, sem motivos, do nada, do nada, eu quis apenas ficar longe dele. Mas não era só dele. Eu quis ficar distante de todos e de tudo.

E não importa se as pessoas estão apenas sendo delicadas, se estão mesmo preocupadas conosco, se estão de alguma forma a dizer que se importam... se perguntam sobre a tese, soa sempre como cobrança. Autocobrança.  

Também parei de querer encontrar os amigos, parei de querer ir até na UMinho e principalmente lá. Toda hora que ia lá e encontrava um conhecido, a pergunta de sempre: e a tese?????

A biblioteca da UMinho parecia me engolir. A cada hora eu encontrava um autor novo. Já tinha mais de 200 páginas escritas com citações e minhas interpretações acerca delas e eu ainda tinha uns 30 livros na fila para terminar a leitura.

Engraçado como a banca sempre sugere novos autores...  eu penso que o meu tema, sem mudar nada, com tudo igual, até as mesmas fontes e material coletado, cabem mais uns dois doutorados.

Neste processo de cozinhar meu juízo, eu me perguntava a toda hora: qual a hora de parar de procurar novos autores? qual a hora de ignorar novos artigos? E se alguém escrever algo que eu penso ser uma conclusão da tese a discordar do que penso? e se alguém estudar algum dos processos evolutivos da parte tecnológica ou editorial que eu estou estudando e disser algo novo e relevante?

E eu me sentia afogando cada vez mais. 

O que eu não compreendia era que os meus resultados não eram o mais importante. O processo de amadurecer a pesquisadora, o processo de amadurecer a investigadora, o processo de certeza ética e metodológica era o mais importante. 

Doutorado, por melhor que se explique o que é, ainda é algo confuso. Mas para mim, o que ficou claro é: nasceu alguém sem certeza de nada, nem mesmo dos resultados, mas com a certeza de ter sido ética, de ter tido rigor científico, de ter tentado analisar os dados com imparcialidade e de ter tentado oferecer respostas às dúvidas que a hipótese levantava. 

Das certezas que eu tenho agora: eu sofri, amadureci, vibrei, descobri, analisei, criei, evolui. E nada é para sempre certo ou é certo para todos. 

Alguém vai sempre contradizer o meu resultado. 

Eu vou sempre aprender algo e sem saber se o que aprendi servirá para outrem que não apenas para mim. 

E a maior das certezas, o doutorado foi a maior montanha que eu subi. Estava sozinha, quase caí. Mas finquei a bandeira lá no pico da minha maturidade emocional, muito mais do que da minha maturidade acadêmica. Pois quase enlouqueci.

Agora é descer, humildemente arrastando a bunda no chão, para não cair de vez, nesse palco egoíco que é o mundo acadêmico. 

Feita a defesa, preciso confessar que a espiritualidade amiga esteve sempre comigo, principalmente nos momentos em que eu pensava em desistir e nos quais eu me achava pequena demais para a tarefa monstruosa de analisar tanta coisa. Alguns dirão que era meu inconsciente... só hipóteses.

Eu sei que ficou muito ainda por analisar e quando o diploma sair, já reconhecido em solo brasileiro, tenho que escrever artigos. Mas agora eu só sinto um cansaço, uma preguiça acadêmica. 

Sem contar que adoeci depois. Foram três dias de cama, só não achei que era covid por causa de dores de pescoço, ombro e braço, nada de febre ou tosse. 

A pergunta que martela meu juízo agora: será que ainda quero estudar algo novo???? 





segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Como estão os seus segredos?

 Segredos. Quais estão indo para o túmulo quando você se for? o que fez e nunca disse a ninguém? quem você amou que nunca saberá? Enfim... você já pensou se há algo que gostaria que fosse revelado à outrem com a sua morte?

Fiz meu testamento em outubro de 2020. E tenho procurado dizer a Arthur como quero meu funeral, caso não morra de alguma doença infecto-contagiosa e nem funeral tenha. Ah, tempos de covid. 

No leito de morte de meu pai, já sentindo que o tempo dele se esvaía, aproveitei aquelas últimas horas para relembrarmos coisas de minha infância e adolescência e como eu não tinha segredos para ele, eu acabei contando um segredo de meu irmão. Em um primeiro momento, não sei porque agi daquela forma e fiquei com receio do meu irmão não gostar. Mas não, quando soube, meu irmão me agradeceu. Meu irmão não estava perto, só chegou na cidade após o falecimento. E vi nos olhos dele que foi um alívio eu ter contado. Naquele momento era um grande segredo, depois se tornou público. Era o nascimento de um filho fora do casamento. Era importante compartilhar com meu pai. Era mais um neto. E eu o fiz.

E fico sempre pensando, quem mais deveria saber sobre sentimentos e ações da minha vida, que não sabe?

Acho que refletir sobre isso me leva a escrever. Foi por este motivo que este blog foi criado. Foi uma forma que encontrei de falar de muita coisa para o meu Arthur pequeno, como se ele já fosse adulto e pudesse me entender.

Um dia eu espero que ao ler o que aqui se encontra nos anos de 2008 a 2015, ele possa dialogar com a minha forma de pensar, caso eu não esteja mais no plano físico.

Penso que todo pai e mãe de filho pequeno deveria ter uma forma de deixar claro o que pensa da vida e de questões importantes, como ética, política, relacionamentos, etc.

As vezes convivemos com pessoas que amamos mas não deixamos claro o que pensamos de assuntos realmente importantes para nós, com medo de ferir, de machucar, de ser de uma opinião contrária.

Ou ainda com medo de exposição demasiada, de uma crítica, enfim. Como é inevitável, pense sempre naquilo que deixou de falar, de contar e se isso faria diferença na vida de alguém. Se a resposta for sim, encontre uma forma, nem que seja quando o inevitável acontecer, daquela pessoa saber.


domingo, 3 de janeiro de 2021

Afetividades: intenção, atenção, ação e resultados

 Tenho procurado me relacionar com afetividade. Afeto. Afetar. 

Tenho procurado olhar o outro, o filho, a mãe, os irmãos, os amigos, todos com afetividade. Não é só tratar bem ou com todas as emoções que aquela relação me permite. 

Desde o amor incondicional ao filho, o amor grato e cuidadoso pela mãe e irmãos, o amor fraterno aos amigos. Mas um tipo de amor que não sei muito como designar, que permite principalmente perceber no outro o que a minha interação com ele me possibilita aprender sobre mim e sobre as minhas emoções e só pela interação, ter amor ao outro como se tem com os mestres.  

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Viver perto do Velho Chico, uma experiência fantástica

Final de 1998, com um ano de formada em Jornalismo pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, o meu desejo era voltar para a Bahia e trabalhar no mercado da comunicação social do estado. Eu tinha tido experiências em três emissoras de televisão, uma em Mato Grosso e duas em Mato Grosso do Sul, ainda como estudante, e experiência em rádio. No ano de 1998, alguns meses de uma experiência incrível no Rio e trabalhos em campanha eleitoral e assessoria política em MS, mas a vontade de voltar para minha terra era profunda. Então no dia 01 de novembro de 1998 eu cheguei em Juazeiro, para assumir o meu primeiro emprego em TV depois de formada.

Eu me lembro da cor do Velho Chico naquele período, era como ver o mar. E eu fiquei logo apaixonada pela Orla de Juá e de Petrolina também.

Na TV Norte eu fiquei por quase dois anos. Foram memoráveis. As descobertas que eu fiz, cada vez que ia ao interior do município fazer reportagens: que povo lindo, o povo sertanejo! Aprendi a admirar a força, a coragem, a gentileza, a humildade e a esperança do povo do sertão. As comidas, como eu gostava de fazer matérias sobre receitas. Comi bode de tudo quanto é tipo, que maravilha. O Bodódromo de Petrolina. As frutas da irrigação, que doçura, nas dezenas de reportagens que fiz na Embrapa e nas propriedades dos pequenos produtores dos projetos irrigados de área federal, onde conheci pessoas tão lutadoras e tão generosas. Como eu ganhava presentes: mangas, goiabas, cebolas, umbu, eu ganhava de tudo. E um dia ganhei rosas e chocolates por conta de uma reportagem linda que conseguimos colocar no Globo Rural.

As oportunidades que a TV Norte me deu foram muitas, pois nossa equipe colocou muitas reportagens na Globo News, no Globo Rural e no Jornal Hoje. Fui ao Rio de Janeiro com o querido Ailton Nery, o repórter cinegrafista talentoso que comigo foi sempre uma parceria harmoniosa, e ficamos por lá por pouco mais de um mês a fazer intercâmbio, a aprender, mas também a mostrar que no interior tínhamos bom texto, bons profissionais de reportagem e imagem. Inclusive me questionaram se eu não tinha interesse em ir trabalhar no Rio, em tentar algo por lá. Escutei de várias bocas: nem sabia que no interior da Bahia tinha repórter já prontinha para trabalhar em rede. Quê? uma Universidade Federal forma repórter para trabalhar em todos os cantos. E a minha escolha era o interior.  





Da TV Norte trago saudades no meu coração. De ter conhecido e entrevistado Manuca, meu poetinha da alegria, da irreverência, que brincava com as palavras, de quem ganhei livro autografado. 

Também vivi a experiência de entrevistar outros artistas que eu admirava, como Belchior, Alceu Valença, Zé Ramalho, Djavan, Zélia Duncan e tantos outros, pois aquela região de Petrolina e Juazeiro recebe muitos artistas em festas maravilhosas.  

Saudade de ter convivido com profissionais que admiro e sou amiga até hoje, como a querida Sibelle, comunicadora cheia de brilho e sabedoria.

Sinto que sou quem sou na atualidade porque vivi e me banhei no Velho Chico, e fui uma profissional muito feliz na TV que me acolheu quando recém formada e me proporcionou experimentar no telejornalismo a criatividade e a alegria que me vai na alma.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Zeza, do chocolate e do religare, nos deixou

 Quando se é criança e jovem, algumas pessoas marcam para sempre a nossa vida, entretanto marcam-se mais com ações do que com palavras, pois a compreensão das coisas na mente e na percepção de alguém muito jovem ainda não é completa. Pois bem, a Zeza, uma das melhores amigas de minha mãe,  fez isso por diversas vezes na minha vida. 

Destaco a primeira, que se repetiu por anos: Zeza ia visitar a mãe dela e a irmã, todos os dias. E no caminho para a casa da mãe dela estava a nossa casa. Éramos muito crianças. Talvez cinco, seis, sete, oito anos. Pois aos nove mudamos de bairro e aquela festa acabou. Mas por muito tempo Zeza passava na porta, e sempre que podia ela dava um alô para minha mãe, sua amiga desde a mais tenra infância, e dava um beijinho em cada um dos filhos de minha mãe, que eram como sobrinhos para ela. Além do beijinho, um bombom de chocolate. Como era bom a visitinha da Zeza. Lembro de minha mãe dizer que ela dengava muito a gente, que não desse doces. E Zeza passar, fazer sinal de silêncio, para que não contássemos que ela estava ali, dar um chocolate e rindo, ir embora sem falar com minha mãe, mas nos deixar super contentes. Ah, que lembrança moleca e linda. 

Meu Deus, que alegria aquele chocolate nos causava. Primeiro porque na cidade o cheiro de chocolate ao fim da tarde era a essência típica, a Ceplac e a Nestlé queimavam amêndoas de cacau e subia um cheiro maravilhoso que tomava o ar. Meus pais não eram de comprar chocolate. Tudo era meio regrado lá em casa. 

Não sei, só sei que associei chocolate à Zeza. Zezé, Maria José, Zeza para os mais íntimos. 

Outra lembrança legal é que as amigas combinaram, entre elas, de uma mãe ir buscar a garotada na AFI, a escola de freiras onde todas as meninas estudavam. Uma mãe em cada dia da semana, assim cada mãe ficava tranquila por quatro dias, sabendo que as filhas estariam com uma amiga. Daí nossas mães iam nos buscar na casa daquela que pegou a galerinha. No dia de Zeza nos pegar na AFI era uma farra. De chocolate, de alegria. Era a mãe mais divertida. Era afetiva, amorosa  e sempre trazia doces.

Essas memórias da menina são recheadas de momentos divertidos, na casa dela, na nossa casa. Ela era mesmo uma mãe calorosa, com as filhas e com as amiguinhas. Tinha uma cadelinha pequenês na casa de Zeza que eu achava divertida, rabugenta, mas muito amada. Meu pai só gostava de cães grandes. Teve apenas dois. Ah, como era legal ficar na casa de Zeza. Outra coisa, lembro muito dela a rir com meu pai. Os dois fumavam, iam juntos até a varanda, e ficavam lá a dar risadas. Eu penso que eu curtia esses momentos entre eles, apesar de não curtir o cigarro kkkkkk, mas sim, ela combinava muito com o jeito do meu pai de ser, alegre, bom humor, sempre rindo. 

Daí mudamos de bairro, comecei a trabalhar cedo, tempo ficou escasso, ver Zeza era mais raro. Depois até voltamos para o mesmo bairro e ver Zeza sempre era um prazer. Mas daí que fui embora para MT, depois MS, muitos anos fora. 

Entretanto, a presença dela era marcante.  

Nos anos em que a minha comunicação com os amigos da Bahia e os parentes era complicada, eu só tinha dinheiro para falar rapidinho uma vez por semana, por telefone, com minha mãe e meu pai apenas. Mas Zeza sempre enviava recadinhos por mainha. E quando ela estava na casa de minha mãe, falávamos rapidinho algumas vezes, sempre com muita saudade e carinho.

Quando Mara, minha mãe, foi em 1995 à Campo Grande, eu estava num momento muito difícil. Vivia deprimida. Ela me trouxe um livrinho, presente de Zeza, que fez toda a diferença naquele momento e em todo o meu futuro.

Zeza não escreveu nada no livro, eu prontamente liguei para ela e falei: ei, faltou você escrever um recadinho. Ela falou, eu anotei. 





Com muito amor e votos de eterna felicidade. 

Já falei do efeito do livro em minha vida em post anterior. Eu gravei o livro inteiro numa fita cassete e ouvia no walkman. Foi curativo. Remédio de alma. Até hoje ele é muito usado por mim.  

Conversei com a minha mãe hoje. Ela disse que há cerca de duas semanas comentou com Zeza o quanto aquele livrinho era usado por mim. E como ela ficou feliz com isso. 

Minha mãe não falou da segunda receita de Zeza, a que carrego comigo há muito tempo. Desde 1996, quando fui à Itabuna em visita e ela me deu um papelzinho escrito "Coração Divino de Jesus, Providenciai..." e explicou-me que do lado oposto eu deveria escrever sonhos, desejos, necessidades... para mim, para os meus, para o mundo. Pronto. Virou rotina anual. Uma caixinha com os pedidos à Providência. Já dei de presente caixinhas com a receita para muitas pessoas ao longo desse período.  A receitinha dela. 

Fui assaltada. Levaram minha bolsa. Três meses depois acharam meus documentos numa fazenda, enrolados num saco plástico e lá estava ele, o papel original,  da receita, com a letra da Zeza. 


Guardo agora em lugar seguro. Guardo na alma a receita. Ensinei meu menino a desejar também e entregar ao Divino. 


Fui hoje ao perfil dela no Facebook e lá estava, numa postagem de uma foto dela, um comentário meu, a dizer que eu a amava. Que, coincidentemente o meu filho e a neta dela eram amigos, na escola em que estudam, em Salvador e não fui eu nem a minha amiga de infância,  filha de Zeza, que apresentou os dois. Foi uma "coincidência". 

Não acredito em coincidências. Para mim, a vida é feita de sincronicidades. 

A amizade deles, a continuidade dessa boa energia entre um pedacinho de mim e um pedacinho de Zeza é um paliativo na dor que sinto hoje. 

Zeza está entrando no céu. Deve estar levando doces para os anjinhos. Deve estar a rir na porta com São Pedro, como fazia com o meu pai, sempre que passava pela porta e o Kila estava em casa. Deve estar a dizer coisas engraçadas às beatas. Deve estar a achar-nos dramáticas, nós, as suas amigas, suas sobrinhas, suas filhas, pois estamos todas sem chão com a sua partida tão cedo e tão inesperada. 



Deve estar lá no céu assim, já de braços abertos, a aguardar-nos lá, para, reunidas, festejarmos a vida eterna.