Fui ao INSS para pegar uma certidão de tempo de serviço para averbar em minha instituição, já que comecei a trabalhar ainda muito jovem e depois de dez anos em órgão público, é hora de somar e saber quanto de tempo eu já tenho de contribuição à previdência pública.
Agendei há exatos cinco meses e lá fui eu, 45 minutos antes da hora marcada (capricórnio me governa, como perco tempo estando sempre adiantada ou no horário!). Ao chegar, como sempre costumo fazer, observo o ambiente com discrição, mas imaginando as histórias de vida de alguns rostos expressivos ou quando algum fato me chama a atenção para um determinado personagem.
Eu tomei consciência do que significa previdência, quando me deparei com tanto idoso, gente com aspecto de acidentado, com muletas, curativos, andando com dificuldade e para diminuir um pouco o peso da energia reinante, havia mulheres grávidas e outras com crianças de colo.
Sim, todo mundo em busca de seus benefícios.
Duas mães me chamaram a atenção. A mim e a todos. Por isso relato aqui os dois episódios.
A primeira mãe chega com dois meninos. Um maior, com uns sete anos e o outro, com menos de quatro. O maior ficou na dele, arrastando um carrinho no chão. O menor, já chegou choramingando, grudado na roupa da mãe, que andava com certa dificuldade, e dizia: não quero entrar, vamos para casa. Ela sentou-se em frente à recepcionista da triagem e enquanto ela explicava uma determinada situação, a voz dele passou a ser mais alta e o choro mais intenso, e os gritos imperativos do menino para ir embora dali. Ela calminha, nem dava bola, ou acariciava ele e dizia para ter calma. Vi todo mundo começar a ficar incomodado. O menino já berrava, puxava a roupa da mãe, já dava para ver a barriga. A sensação era que ele rasgaria a roupa da mãe. E ela educadinha. Nos rostos das pessoas eu ia lendo uma certa indignação, como se faltasse punho da mãe. Havia desaprovação geral com relação ao comportamento do menino. Até que a atendente pediu diretamente ao menino que se comportasse. Como se a mãe nem estivesse ali. Ele nem deu bola.
Já rolava mais de cinco minutos de berros, quando essa mãe se virou devagar, ajeitou a bolsa e deu uns tapas no guri e disse: 'olha aqui, rapazinho, você não se comanda. Eu estou operada, me respeite, daqui a pouco nós vamos, cale a boca e se comporte. Tá pensando que eu não bato só porque tá na rua? quem quiser que fale mal de mim. Menino mal educado!'. Vi que todo mundo mudou a expressão. Havia um olhar de aprovação em todos aqueles velhinhos ali. A atendente disse 'calma mãe, é só uma criança'.
Confesso que eu senti um alívio por esta mãe. Ela agiu na hora certa e muito embora não seja permitida palmada, discursos de violência à parte, eu achei que era preciso estabelecer limite e ela o fez, mostrou que não criava de qualquer jeito. E eu fiquei pensando na hipocrisia de uma sociedade que não sabe o limite entre violência e educação. Não queremos palmadas. Mas como aquela mãe poderia ou deveria se comportar?
A segunda mãe entrou silenciosa, trazia um bebê no colo, acordado mas quietinho, sentou-se afastada. Olhei para ela e para seu bebê. Era um bebê com a cabeça pequena, de formato diferente. Uma vítima da microcefalia. Vi que muitas pessoas a olhavam.
Fiquei observando os olhares. Eles refletiam pena e curiosidade. Vi que pessoas acompanhadas comentavam entre si. Fiquei pensando no quanto essa mãe deve enfrentar isso no dia a dia. E em que tipo de energia isso se reflete para ela e seu bebê.
Ela era prioridade e logo foi para outro setor. Quando fui chamada também para este novo setor, vi que ela dava de mamar ao bebê e após algum tempo, ela o beijava, com carinho, brincava com ele, sem se importar com nada. As pessoas olhavam e havia olhares de admiração, de aprovação e de carinho. Olhares mais tranquilos. Novas energias no ambiente. E eu vi ali o sentido da maternidade, da proteção e do amor mais profundo que uma pessoa é contemplada quando se é mãe de alguém.
Conto os dois fatos, enquanto dramas reais de duas mães e do social em volta. Desta que tem a tarefa mais árdua, de educar, criar a sociedade do futuro. Daquela que constrói a cada momento o destino da humanidade. A sociedade não valoriza suas mães. Elas são vítimas de julgamentos de todo tipo, desta novela que é a vida real.
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