Meditações, impressões da vida, memórias revisitadas, crônicas fotográficas, muito blá blá blá... É só para deixar registrado o que penso do mundo (antes que eu morra e não conte, ou mostre, nada a ninguém).
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012
Carnaval da pose
Há quatro anos ensaio ir ao Carnaval de Maragojipe e este ano finalmente fui, com companheiros do CS, conhecer a folia de Momo, bem ao estilo interiorano, que mescla um pouco dos velhos carnavais de quando eu era menina, com suas marchinhas, fanfarras e bandas, meninos soltos pelas ruas, porque há sempre alguém conhecido de olho nos filhos da comunidade. Mas há um toque especial, dado pelo desfile de belas fantasias dos maragojipanos, em todo o centro da cidade.
Com uma tradição secular de promover e incentivar o uso de adereços e máscaras no carnaval, Maragojipe nos surpreende pela variedade de fantasias e pela disponibilidade dos mascarados em posar para quem fotografa.
Fiquei pensando em todos os textos que li que faziam referência à pose fotográfica, ao ver os grupos elaborando gestos para serem imortalizados em câmeras de pessoas desconhecidas, em arquivos que nunca olharão, ou que nunca enxergarão as fotos impressas.
Adorei os grupos caminhando em direção dos que estavam com suas armas de raptar imagem, se predispondo ao instante congelado.
Há toda uma encenação, são pacientes, caminham horas, indo e vindo pelas praças do centro de Maragojipe, e aguardam todos fotografarem.
E são muitos, os que com suas amadoras ou profissionais câmeras, não querem perder nada. A metalinguagem da foto da foto, aqui é fácil, fácil...
Quando falamos algo com os mascarados, mudam a voz.
_ São personagens, deixam claro. Se havia ali alguém conhecido, ignoro.
Mas vi também fantasias de rosto quase nu, apenas maquiado ou transvestido e acho que a doação é ainda maior, porque
muitas vezes há o feio, o ridículo ou até o grotesco, que se revela na lúdica brincadeira momesca, flagrada em fotos para a posteridade. Impossível não rir quando nos deparamos com algumas caras e bocas de quem ousou vivenciar a festa de verdade.
Magnífico, pensei.
E do lado de cá da máquina que fotografa, eu senti uma pontinha de inveja (branca), de quem se lambuza deste carnaval ingênuo, liberto, romântico e generoso.
E me prometi: um dia serei eu a fotografada.
Eu e a Galera CS, foto de Greg
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
Culturalmente em rede
O Digitália, Congresso e Festival Internacional de Música e Cultura Digital, foi mais um desses eventos que nos revelam um universo de ações e reações que rolam em função de um mundo conectado. Na primeira palestra, do Ronaldo Lemos, ele mostrou dados impressionantes sobre o uso das lan houses. Pesquisador da FGV, ele conseguiu mapear cenas musicais nas periferias de vários países e é incrível como as comunidades se revelam através de música que nunca chegaria a grande mídia e que hoje, com a net, faz sucesso e atrai milhares de fãs. E como a troca, o intercâmbio de arquivo pessoal ajuda a disseminar o que rola nas periferias. Volker Grassmuk, estudioso de uma universidade alemã, fez um apanhado histórico da colaboração humana, para mostrar que o que vivenciamos na rede é algo sem precedentes. Sim, estamos na era da inteligência coletiva e vivendo a grande onda da colaboração intelectual. Nossos conhecimentos compartilhados estão nos fazendo, de modo geral, produtores do grande repositório de conteúdo chamado internet.
Messias Bandeira, da UFBA, o grande mentor do Digitália, fez uma palestra fabulosa sobre a revolução musical pela qual passamos nos últimos dez anos, com a possibilidade de colocar ou retirar da rede nossa soundscape, nosso universo de melodias e sons, que nos dizem quem somos. E como os músicos se apropriaram de suas criações com a autonomia que ganharam quando as gravadoras já não eram as únicas a mostrar quem faz sucesso. E Javier Bustamante, estudioso espanhol, nos mostrou como tudo isso está delineando a tal cultura digital, esse emaranhado de coisas novas e nem tão novas assim, mas que estão interligadas e nos fazem autores de uma nova história, cidadãos com iniciativa e canais de divulgação, pessoas que com pequenas ferramentas (celulares, câmeras, gravadores, criatividade, inventividade), temos nossas cartolas mágicas, engenhocas que chamamos de computadores e smartphones, ligados e conectados e com eles damos destino a nossas mais inventivas ações. E o computador não é apenas uma ferramenta, é uma incógnita ainda de possibilidades de interação. Frases virais, videos que viram febre, músicos que ganham notoriedade do dia pra noite, comunidades indígenas que se comunicam e denunciam, sexo virtual, e tantas e outras tantas coisas que fazemos com essa maquininha que temos em frente aos olhos e dedos... Javier não tem dúvida que o computador nos faz mais humanos, mais solidários, mais interconectados.
***
Gilberto Gil foi um caso de amor à parte no Digitália. Um dia na desconferência, junto com Paul Miller, o DJ Spooky, de NY, Jucá Ferreira e outros, em um papo descontraído, falou de um Brasil que tem mostrado ao mundo que ser lúdico vale a pena. Dia seguinte, sem nenhum tipo de segurança por perto, atencioso, participando de oficinas, conversando com todo mundo, era um show de gentileza.
Mas quem me impressionou mesmo foi Spooky, um dos mais consagrados Djs do mundo, escritor, teórico de uma nova forma de pensar música digital, ele é muito atencioso, pena que meu inglês foi de apenas cumprimentos e elogios. Mas marcamos nossos olhares cheios de boa energia com essa foto. Ele é um ser especial.
Adorei conversar mais com Álvaro Malaguti da RNP, saber sobre os projetos que poderemos integrar enquanto UFRB, que, diga-se de passagem fez bonito no Festival, com Jarbas Jacome, Danillo Barata e Claúdio Manuel, também organizador e membro do Coletivo Xaréu, que fez uma linda apresentação.
E muitos alunos de jornalismo, cinema e artes visuais, mostrando que estamos chegando com cara, coragem e talento.
E por fim, por conta da greve da PM, que de alguma maneira prejudicou o festival (várias festas foram canceladas), uma vitória no final. Encerrando o evento, o show do Stomp stage experience (NY) e Criolo, na Concha lotada, depois de tantos cancelamentos de shows Salvador à fora... E estava tudo tão bonito e tantos livros foram trocados por ingresso. Foi muito bom ver essa vitória do Messias e do Claúdio! E olha eu e o Guido aí em meio a tanta gente!
Eu, de cá do meu mundinho digital, fico torcendo para estar no próximo Digitália e agradecendo ao Universo por esse Congresso maravilhoso ser na Bahia.
domingo, 5 de fevereiro de 2012
Estado de Sítio
Três dias em uma cidade sitiada. É essa a sensação que tenho, estando em Salvador. Mas por conta do Digitália (Congresso e Festival Internacional de Música e Cultura Digital), tenho saído de Stella Maris e ido ao Corredor da Vitória todos os dias, sempre às 7h:30h e voltado as 21h, 22h (são quase 70 km ida e volta). Na quinta-feira, com a Festa de Yemanjá, já sabia que a cidade estaria com trânsito maluco, e eu e Aless decidimos deixar carros em casa e irmos de bus. Foi tranquilo até as 18h, quando um pânico geral tomou conta da cidade. Aí o jeito foi buscar carona pra não ter que andar de buzu e dar um tempo em local seguro para não sair enquanto houvesse engarrafamentos. Na sexta e no sábado, fui e voltei de carro, sempre procurando no twitter as informações dos lugares por onde passaria. Os muitos boatos eram de assustar. Mas eu sabia que havia perigo real, caso ficasse presa em um engarrafamento em local complicado, porque os arrastões contra motoristas parados estava acontecendo.
A sensação que tenho é que apertaram um botão direcionado à bandidagem onde está escrito: pode tudo contra o outro.
Os índices de assaltos, homicídios e vandalismo aumentaram nesses três dias e a população resolveu ficar em casa.
O Digitália esteve com público bem abaixo do esperado. E sábado à noite havia centenas de vagas para estacionar no Rio Vermelho (o bairro mais boêmio da cidade), às 22h, quando passei. Vi uma moça chateada porque haviam quebrado o vidro do carro e saqueado o automóvel, em frente ao Instituto Goethe, local nobre, as 14h da tarde de sábado.
E fiquei me questionando se o governador sabia o que poderia realmente acontecer quando deixou que as coisas chegassem ao nível que chegaram.
Há dias eu escutava falar de uma greve de policiais. Insatisfação da categoria eu escuto há anos. Tenho amigos oficiais da PM. Sempre os ouço falar da estrutura capenga, dos salários complicados, principalmente para os soldados, que se expõem nas ruas, com suas fardas alvo-fácil da bandidagem, de suas viaturas nem sempre equipadas. Os amigos que tenho, são pessoas que acompanho a vida pessoal, pais carinhosos, filhos dedicados e amigos leais, e foram eles que me ajudaram a ter uma visão diferente da polícia, porque meu pai, extremamente preconceituoso, e tendo vivenciado a ditadura, falava de uma polícia despreparada, truculenta. Foi a imagem que ficou, até eu conhecer mais de perto o cotidiano de dois amigos e de suas famílias.
Vejo os fatos e me pergunto se são os soldados insatisfeitos que estão agindo de forma equivocada, encapuzados parando ônibus e impedindo um direito constitucional de ir e vir? ou são ações de quem quer que acreditemos que são eles para descredibilizar a polícia militar?
Como repórter de rua em quatro emissoras pelo interior da Bahia, acabei fazendo amigos na Corporação quando ia cobrir eventos em Juazeiro, Feira de Santana, Itabuna e aqui em Salvador. E sei que muitos policiais votaram no PT. Acreditaram que segurança seria realmente prioridade e que o trabalhador da segurança seria valorizado. Assim como eu, na educação, eles também se decepcionaram com o modo petista de administrar.
Por isso reproduzo aqui a carta dos oficiais. Ela fala melhor que a cobertura midiática da greve.
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012
Revelando meu quintal
Depois de fazer uma super propaganda de Cachoeira, São Félix, Maragojipe e Saubara, (que a cada oportunidade para conhecer mais e mais, eu não dispenso) propus a três companheiros do CS (Marcos - guest espanhol, Anthony - holandês que mora na Grécia e Arbert - colombiano que mora na Bahia há um bom tempo) para fazermos um passeio em busca de paisagens, gente do interior e comidinhas típicas e eles toparam. Marcos é um estudioso da sociologia e da antropologia, Anthony é arquiteto e artista plástico, adora desenhar rostos e Albert é ecólogo, tem um projeto na Chapada, onde nasce o Paraguaçu. Eu sabia que cada um, à sua maneira, faria boas descobertas.
Saímos super cedo e nosso café da manhã foi tipicamente nordestino, na estrada, no Maria Antonia, lugar que acho agradável e variado. Os pratos com beijus, cuscuz, canjica, bolos e petiscos bem regionais, além de muitas frutas, me provaram que a escolha fora acertada:
Abastecidos seguimos para Maragojipe, e depois de mostrar o centro e a orla, onde eles viram as marisqueiras e fotografaram o cotidiano dos maragojipanos e de pescadores, seguimos para Coqueiros.
No povoado de Coqueiros, o objetivo era ver ceramistas, e o universo conspirou. Dona Cadu, de 91 anos, estava a cantar e fazer suas panelas. Um momento mágico conversar com essa senhora de 91 anos, com suas histórias maravilhosas e seu bom humor!
E depois foi um tal de comprar panelas...
Para abrir o apetite, cervejinha onde Rio e Mar se encontram, e claro, um Albert encantado, porque ele ajuda a preservar a nascente do maravilhoso Paraguaçu, o maior rio genuinamente baiano.
Depois paramos em São Félix, no Ferroviários, onde o sempre gentil Eraldo nos serviu maniçoba como entrada (eu não poupei ninguém e todos adoraram) e depois fumeiro com purê de aimpim (verdadeira lambança). Fiz os tres adotarem árvores no Centro Cultural Dannemann, onde adoraram fotografar e conversar com as charuteiras, e ver as obras expostas, resultado das Bienais do Recôncavo.
Passeamos por Cachoeira e seguimos para Saubara, onde fomos apreciar as vilas e o mar calmo no final da tarde.
Só recebi elogios pelo roteiro e pelas escolhas gastronômicas. Penso que Anthony, com suas fotos, terá muitos rostos para pintar. Marcos com as conversas com pescadores, marisqueiras, charuteiras, conheceu um pouco desta gente do interior e Albert, com seu olhar de ambientalista, ficou ainda mais orgulhoso do trabalho que faz na Chapada. Eu? ah, sinto um prazer enorme de ter esse quintal lindo e variado! E só penso que é preciso conhecer para conservar...
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