sábado, 17 de junho de 2017

Motorizada em Braga

Eu já comprei dois carros em menos de um ano em Braga. E eu nem pensava em dirigir por cá.
Mas pensando em melhor me locomover, pois aluguei uma casa em um local que não tem transporte público perto, acabei comprando um primeiro carro para ajudar uma amiga, que estava indo embora.
O primeiro carro eu paguei dois mil reais para a minha amiga, na época, o equivalente a 550 euros. Era uma carro ano 1986. Isso mesmo, um carro com 30 anos (foi em dezembro de 2016).
Super bem conservado, com 56 mil km rodados. Todo arrumadinho, com vidros elétricos, 4 portas!

Mas era um carro duro de dirigir, um freio de mão que eu mal conseguia baixar e havia um problema no reservatório de água, tinha que completar todo dia. Então não gostei e acabei vendendo para um português que gostava de carros antigos, mas ele só me pagou 400 euros. Ai prejuízos!
Meses depois, cansada de esperar ônibus em um ponto a 800 metros de minha casa e de pagar taxi em dias de chuva e frio, eu comprei um carro ano 1996, com 270 mil quilômetros rodados. Isso mesmo. É um carro velho. 270 mil. Eu o comprei apenas para andar dentro da cidade onde eu moro.
Uma curiosidade, Em Lisboa o meu carro é proibido de trafegar. As regras da União Europeia proíbem veículos velhos de trafegar em cidades grandes, por conta do excesso de gases tóxicos emitidos por esses carros mais velhos.
Na verdade, eu comprei o carro já pensando no próximo inverno. Porque no inverno fica bem complicado transitar pelas ruas. O frio e o vento cortante são desencorajadores. Então para ir à Universidade e a um mercado fazer compras, o carro é um bem muito útil.
Neste último carro eu paguei 430 euros, mas ele estava com problemas sérios e não passou em um exame de verificação obrigatório e eu gastei mais 270 euros para consertar o que estava complicado e ele passar no exame. Ai prejuízos!
Cá, é possível comprar carros velhos mas em bom estado, desde que não se exija tanto do veículo. Alguns colegas meus, compraram carros por mil, mil e duzentos euros, o equivalente a 5 mil reais. mas são carros ainda muito bons para rodar e poder viajar.
O diferencial aqui, em carros velhos, é a forma de manutenção e a gasolina que é consumida pelo povo português. Uma gasolina de alta qualidade. Meu carro, por exemplo, faz mais de 16 quilômetros com um litro de combustível, na cidade. E na estrada, nas poucas vezes em que ousei sair de Braga, fez mais de 20 quilômetros com um litro. É um carro da marca fiat, um punto, 1996.  Ele é carro simples, de direção manual, não tem alta tecnologia. Mas a boa gasolina ajuda a manter a vida do motor.
Outro diferencial é o asfalto bom. Isso conserva o veículo. Aqui paga-se um imposto sob circulação mas se vê o resultado. O IUC é um imposto anual, eu paguei 38 euros de imposto.
Há ainda mais um diferencial. Todos os anos o carro é obrigado a passar por um exame de verificação de suas condições de segurança, onde se avalia tudo. Esse exame emite uma certificação e quando a polícia rodoviária nos para, em blitz, pede além dos nossos documentos, os documentos do carro, que inclui o resultado desse exame e também um seguro, que é obrigatório e que cobre as despesas de uma batida com outrem ou de um atropelamento. Se a pessoa não tiver esse seguro e essa carta de certificação do carro, o carro é apreendido e pode perder seu direito de dirigir.
Por isso fazer uma revisão geral anual e colocar o carro em funcionamento total é uma obrigação. Isso garante que o carro receba uma manutenção periódica. Vê-se muito carro velho na rua, mas difícil ver carro parado porque quebrou. Eu vi pouquíssimos em um ano.
É interessante perceber como algumas questões simples dinamizam a vida do cidadão. No Brasil todo mundo quer ter carro com menos de dois anos de uso. Aqui ninguém tem vergonha de ter um carro com dez, quinze, vinte, trinta anos de uso. Aqui orgulham-se de saberem conservar seus carros, a ponto de o veículo ser velho mas bom.
E com isso, ter um carro é algo muito acessível.
E com regras rígidas, com muitos radares espalhados, com muitas faixas para pedestres, com muitas passarelas pela cidade, percebe-se que o sentido de país que prioriza o cidadão, o ir e vir, o cuidado com o outro, é muito presente aqui em Portugal.
 Eu fiz exames de condução para transferir minha carta brasileira para uma carta portuguesa e algo que me chamou muito a atenção foi a preocupação com as faixas, o respeito ao pedestre e também, um sentimento de aguardar a sua vez sempre, no trânsito. Os apressadinhos cá não tem vez. Ninguém sai cortando faixa num engarrafamento. Ninguém tenta avançar sobre uma preferencial. O aguardar faz parte de uma obrigação moral. As rotatórias aqui, chamadas de rotundas, tem regras muito rígidas.
Estar aqui me deu uma sensação do quanto estamos atrasados no Brasil, na forma de lidar com as questões de trânsito, de tráfego e de propriedade de um veículo. Com certeza eu vou voltar muito mais consciente de preservar um veículo e do quanto essa cultura do carro novo é boba e só faz com que tenhamos cada vez mais gente ostentando veículos sem necessidade.

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