quarta-feira, 16 de setembro de 2020

A Mona e o seu sorriso

 Em 2018, eu de muletas, decidi ir com fiotin Arthur para Paris. Tava muito em sofrimento. E era meu aniversário. Peguei dindin emprestado e fui. Ao chegar no Louvre com a minha muleta a reboque, a organização me ofereceu cadeira de rodas, explicaram-me que o museu era enorme e que eu, provavelmente não me sentiria confortável nem poderia ficar a olhar as obras com paz e serenidade com dor. Bom, percorrer o Louvre andando já é complicado para alguém que sofre de joelhos, imagina uma criatura com condromalácia e com menisco rompido? Daí aceitei e fui. Arthur guiava. 



E assim fomos nós. Das 11h as 21h lá dentro, a olhar aquelas obras maravilhosas. Ouvindo as explicações sobre cada quadro. Algumas das obras eu sempre usei como exemplo nas aulas de fotografia, para falar dos estudos de luz realizados pelos pintores ao longo de centenas de anos de História da Arte. Daí a necessidade em ficar algum tempo a apreciar e a observar. 

Arthur me largava em frente a um quadro, quando eu pedia e ia navegar. Oh angústia a minha, dele não perceber a riqueza de estar ali. 

Mas eu sei que um dia ele retornará. Daí relaxei. E aproveitei. 





Entretanto, fiz cá minha crônica visual do guri no Louvre, que em alguns momentos demonstrou alguma reação de estar num dos Museus mais importantes do mundo. 



Não apenas as obras, mas a arquitetura do museu, os grupos humanos que ali estão, os apreciadores de arte, tudo chama a atenção de quem gosta de imagem e estuda imagem, num museu daqueles.



Claro que para mim, invisível em minha cadeira, ficou fácil narrar com imagens a minha sensação. Tudo se abre para a cadeira passar, ninguém fica a olhar para um humano numa cadeira. Daí eu me senti muito a vontade para fotografar. 





É claro que  diante de tanta obra bonita, famosa, era preciso escolher e lá pelas tantas o Arthur começou a ficar agoniado: mãe, vocè não vai conseguir ver a Monalisa. 



E aí passamos a ver tudo mais rapidamente, e fomos nós atrás da beldade. 

Num salão enorme soubemos que estava lá a Mona. Ele me levando na cadeira, um grupo enorme de japoneses na frente dela, quadro pequeno,  eu lá atrás... os seguranças foram abrindo caminho, eu nem entendendo nada, só pediram: "Excusez-moi monsieur" para meu filho, pegaram a cadeira comigo à reboque, toda sem graça,  ultrapassaram a linha de segurança e fiquei bem de frente para a moçoila do quadro.

Olhei, ela sorria para mim. Olhei para meu filho, os olhinhos dele brilharam. Nossos olhares eram de surpresa. Olhei para a mulher no retrato, a Mona piscou. Ui. Entendi porque ela fascinava o mundo. Havia um traço ótico de efeito fantástico. 

Ri sozinha. Pensei que todos aqueles meses de muita dor tinham me preparado para aquele estranho sentimento de arte e genialidade de um homem que, mais de 500 anos depois, conseguia emocionar humaninhos. Fiquei uns 5 minutos ali. Fiz sinal e os seguranças liberaram filhote para me rebocar dali... nem ele nem eu tivemos coragem de fotografar a Mona. Ficou só na retina. Na memória. No coração. Na emoção... eu de frente para uma mulher enigmática, que pode ser o auto-retrato do artista, sua versão feminina, enfim... a arte é a linguagem do coração, a expressão da alma. Humanidade não explica arte, só sente...



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