terça-feira, 29 de abril de 2014

'Eu não nasci de óculos', mas eu adoro viver de óculos!!!

Não, não é balcão de ótica. É minha pequena coleção de óculos... Como começou essa história? Eu tinha 15 anos. Fui a uma lanchonete com minha turma de amigos e lá a galera pedindo lanche e eu não conseguia ler o painel com o cardápio. Como assim???!!!!! o Rafael Dórea, que usava óculos, tirou os dele e colocou-os em mim: Milagre!!! eu enxergava o mundo. Escolhi meu lanche e de quebra parei de ter a fama de metida a besta porque não falava com as pessoas (eu não as enxergava). E aí, comprar óculos era necessidade e se fosse diferente, eu ficava fã... pena que eles não duram uma vida, senão eu teria uma hiper super coleção!! Acho que óculos diz muito da gente. E eu até tenho lentes de contato, mas meu contato com elas é sempre um pouco problemático. Uso descartáveis quando tenho um evento pra ir. No dia a dia, são eles, meus companheiros de rosto, que estão comigo. Hoje conheci o Francisco Ventura Júnior. Um designer de óculos, que além de óptico, é pesquisador e escritor. O livro, Olhar atento, da editora Senac, que ganhei, autografado, depois de uma entrevista que fiz com ele, é maravilhoso, porque conta as histórias da sua ótica, da sua marca, da sua família e de como escolher um belo par de óculos e valorizar seu rosto. Além de histórias engraçadas sobre pessoas e suas escolhas. É ele quem cria os óculos da Marília Gabriela. Assisti uma palestra dele e conheci a loja exclusiva na Barra. Linda loja. Não resisti e comprei um par para mim (e que bom que eles dividem em várias vezes, porque pude comprar um modelo lindo, do jeito que gosto, inovador). O Francisco busca inovar de verdade. Tem óculos para quem tem hipermetropia e dificuldade para se maquiar. Uma lente sobe enquanto o olho na outra lente auxilia quem precisa enxergar para se maquiar e vice-versa. Fantástico. Tem óculos esportivos que não desgrudam fácil e outros, tão miniaturizados que ficam menores que um celular. Ideais para usar escondidinhos no terno. Ou ainda um par de óculos colar para colocar em dia de festa e compor a vestimenta... Muito criativo. Mas o que gostei mesmo foi da ideia de vestir os óculos. De poder ser mais que um rosto com lentes. E se Herbert já afirmava que se eu estou triste eu tiro os óculos e não vejo ninguém, mais um motivo para ter um monte de modelos. Porque quero sempre ver tudo, e estar muito feliz para enxergar esse mundo maravilhoso!!! E que legal que hoje existem artistas que se dedicam a fazer objetos tão úteis. Olha a família do Ventura aí: Ele, a esposa, co-autora e sócia, a Débora e o filho lindo do casal, o Felipe.

sábado, 12 de abril de 2014

sobre a vida e sobre a dor

"Deus costuma usar a solidão para nos ensinar sobre a convivência. Às vezes, usa a raiva, para que possamos compreender o infinito valor da paz. Outras vezes usa o tédio, quando quer nos mostrar a importância da aventura e do abandono. Deus costuma usar o silêncio para nos ensinar sobre a responsabilidade do que dizemos. Às vezes usa o cansaço, para que possamos compreender o valor do despertar. Outras vezes usa doença, quando quer nos mostrar a importância da saúde. Deus costuma usar o fogo, para nos ensinar sobre água. Às vezes, usa a terra, para que possamos compreender o valor do ar. Outras vezes usa a morte, quando quer nos mostrar a importância da vida".
Fernando Pessoa 

Convivendo de perto com a dor, a dor do outro, a dor de quem amamos, faço reflexões todo o tempo. A maior delas: como a dor é individual, subjetiva e oscilante. Por mais solidária que eu tente ser, não tenho como sentir a dor do outro. Nem o outro, sentir a minha. E como eu me resigno diante da dor inevitável, quando sei que ela faz parte do processo, eu não entendo como o outro blasfema e mal diz a dor, sabendo que ela é uma dose mínima do milagre da vida. 
Mas compreendo. 
Se a dor é de cada um, e sente quem a tem, como eu, saudável, posso experimentar, por menor que seja, a sensação da dor lancinante de quem teve o peito aberto? 
Quando a dor oscila, e entra momentos de riso, penso que a dor se foi. No quanto a vida simplifica sem dor. E ela volta, de forma até maior que os primeiros dias do pós operatório, e penso como a cura, em alguns casos, é um processo cruel. 
Esquecer uma dor física é tão bom. E o retorno dela, ainda mais forte, traz uma sensação de que algo errado está ocorrendo no organismo. Será que há algo inflamado? será que algum ponto interno se rompeu? será que ficou algum equipamento cirúrgico ou produto hospitalar dentro do organismo? Não é para rir, mas a dor traz fantasmas enormes... inseguranças e neuras. Enquanto isso, minha cabeça viaja nas mil reflexões diárias de quem, estando sem dor, só ora para que a dor do outro passe logo.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Contradições hospitalares

Estou 'quase' internada em um grande hospital de referência em cardiologia da América Latina. Acompanhante de um interno, que fez uma cirurgia complexa, eu fiquei impressionada com o atendimento da equipe médica, a competência dos cirurgiões. E só tenho a agradecer o fato do Brasil ter, pelo SUS, a possibilidade de salvar vidas com tanta eficiência. Afinal, como professora universitária, que tem impostos descontados em folha, eu fico contente de ver o meu dinheiro sendo bem usado pelo poder público. Na página institucional do hospital, que tem vínculo com a USP, está escrito que a instituição 'é reconhecida tanto nacional como internacionalmente, como mostram as citações na imprensa leiga, nas publicações científicas e nas inúmeras participações e comunicações de seus profissionais a congressos nacionais e internacionais'. Maravilha!!!!
Mas por outro lado, depois de uma semana aqui dentro, estou vendo de perto as incoerências de um lugar como esse. Comecemos pelo pré-operatório. Imagina uma pessoa aguardando para operar do coração, em uma cirurgia que vai retirar parte da aorta e colocar um tubo, com todas as ligações arteriais possíveis, e, faltando algumas horas para essa cirurgia, com os nervos abalados, chegam três enfermeiras em menos de uma hora e meia, para tirar sangue dessa pessoa? Quem gosta de receber tanta perfuração? porque não apenas uma enfermeira para coletar tudo de uma vez? desorganização? e mais, duas delas ao mesmo tempo, disputando veia e fazendo algumas perfurações e dizendo que o paciente não é bom de veias? quem não é bom? quem deveria acertar? É de dar nos nervos...
Cirurgia efetuada, a pessoa acorda na UTI. Imagine uma madrugada na UTI, escutando duas enfermeiras, ou técnicas em enfermagem, impossível precisar, duas senhoras, falando de namoro, de paquera, de que o namorado de uma delas faz e acontece... e pela manhã, na troca da equipe, entram enfermeiros novos, dois deles, uma mulher e um homem, dançando forró? e um paciente se anima a cantar, e parte da equipe de enfermagem canta com ele. Achou que eu exagero? Não, eu queria que fosse exagero, mas meu companheiro vivenciou isso e depois eu conheci outras pessoas que estavam na UTI e vivenciaram também algumas dessas situações.
Um deles, o Zé Roberto, entubado, com secreções causadas pela introdução do tubo, tossiu, não tinha como se mover e começou a colocar a secreção pela lateral da boca, porque não encontrou ninguém para ajudá-lo e só apareceu um técnico muitos minutos depois para ajudá-lo. A sensação, ele me contou, foi que poderia morrer a qualquer momento, engasgado com secreção e sem nem poder falar por conta do tubo. Também viu show de forró entre a equipe, dias depois, e também um grupo de enfermeiros organizando uma vaquinha para arrecadar dinheiro para o pastel, com direito a ironizar, dizendo que se sobrasse dinheiro, trariam pasteis para os pacientes também... ora, convenhamos, quem, tendo passado por quatro, cinco, seis horas de cirurgia, peito remendado, se sentindo estropiado com tubo na boca, marca-passo, dreno, catéter, tem paciência para esse tipo de comportamento de equipe de enfermagem de um grande hospital? Então meu companheiro veio para o quarto. Tudo bem mais calmo do que na UTI (que coisa!). Os pacientes ficam em enfermarias com dois leitos e seus respectivos acompanhantes, por sinal, super mal acomodados em cadeiras quebradas. Mas ainda assim a paz que se sente saindo da UTI é impressionante. Todos que conversei relatam que a UTI é um local complicado. Além dos dois internos que tivemos o prazer de dividir a enfermaria em dias diversos (o Sérgio e sua esposa Leny, depois o Zé Roberto e sua mãe), teve ainda os relatos do Josevelto e sua mulher, a Val, que conhecemos no pré-operatório e de uma mocinha que a mãe pegou infecção generalizada na UTI e já estava há 22 dias nesta unidade. Então são opiniões de pessoas que passaram por cirurgias cardíacas e estavam extremamente debilitados, fragilizados, inseguros, precisando de tranquilidade e paz e mais da mocinha que passava, há 22 dias, pelo menos uma hora e meia na UTI visitando a mãe.
 Bom, nas enfermarias é impressionante como conhecemos, a cada dia, equipes de cinco a dez profissionais diferentes, entre técnicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, médicos... Alguns chegam com tanto cuidado, tanto carinho, com um jeito maravilhoso de lidar com o paciente. Fiquei encantada com os mais novos, gente muito jovem, com um sorriso compreensível no rosto e dando todo tipo de explicação para os procedimentos. Mas também vi, entre técnicos de enfermagem e enfermeiros, pessoas que parecem estar com raiva do mundo e toca o paciente com rispidez, faz e tira um curativo como se estivesse carpindo mato, e acaba machucando sem necessidade, quem está ali tão carente, porque tudo está doendo muito e, mais uma dor, mesmo que de um repuxar no corte, não é apenas mais uma dor, é uma dor desnecessária, causada por um profissional que está ali para aliviar os traumas...
Outra questão que me fez ficar decepcionada foi a higiene do lugar. Depois de cirurgias tão complexas... imagina que os médicos manipulam corações!!! então, uma infecção por aqui, colocaria à perder o trabalho de verdadeiros artistas da medicina.
Pois é, então a assepsia deveria, DEVERIA, ser prioridade, certo? Ledo engano. Vi cabelo na comida, vi cestos de lixo com mais de 30 horas sem recolher, vi chão sem varrer e sem passar um pano com desinfetante também por mais de 30 horas, vi banheiro que tive nojo dos azulejos e pia que, penso, mais facilita infecção que limpa o que tá sujo... Será que eu estou observando o que não deveria? será que estou exigindo mais do que um hospital público, de referência cardíaca deveria oferecer? Eu, como fofoqueira social oficializada por bacharelado (jornalista), não consigo ficar sem registrar isso. E penso, no país da copa 2014, deveria haver também eficiência na saúde, como um todo. Se um hospital referência, na maior cidade do país, é desse jeito, o que pensar dos outros hospitais públicos por aí?